sábado, 20 de agosto de 2011

Rubens Gerchman

Tá. Passaram-se 10 anos, pois é. Agora, me vejo nessa perspectiva: sou velha ou precoce? Boa pergunta. Em todo caso, vim aqui para prestar homenagem ao meu padrastro, falecido a três anos, de um câncer meio fulminante e ao mesmo tempo previsível para os artistas que trabalham com tintas metálicas. Câncer de pulmão.

E isso também me fez pensar em coisas do tipo: o artista dedica a vida ao trabalho e morre dele.

Depois disso (meio inconformada), penso: é normal.

Dar. Dar também é sugar do outro a vontade de receber. Suprir a vontade do outro, aniquilar também a necessidade do outro de querer, o quê? O artista é foda. Vai dar, você querendo ou não.

E ele, meu ex-padrastro, vivia imerso nos momentos em que sua arte era posta de fato em desafio, e, em que ele mesmo, Rubens Gerchman, sentia-se transportado por suas opiniões. Opinião 64, seu grande orgulho. Ter participado, fomentado o movimento nas artes plásticas; o Opinião 64. Agitado por companheiros seus como Antonio Dias, Jean Bogich, Roberto Magalhães, esses cito, por terem sido os mais queridos por Rubens. Opinião 64. Um movimento quase anti-neoconcretista (apesar de adorar Hélio Oitica e Ligia Clark). Mas, sempre me dizia, a mim que era apaixonada pelo trabalho de Ligia: "Você, não sei se ia gostar dela, sabe, era uma mulher inteligente, mas seca, muito seca."

E assim, depois, me falava das suas aventuras nos primórdios de uma arte, tão fundamental, para a nossa identidade também, a Nova Figuração, a Pop Art terceiro mundista, barroca e bem amada, apesar de tudo. Era algo que vinha junto de poetas como Gullar em "não há vagas". Anti-conformismo, utópias socialistas, e muita vontade de sacudir a apatia da classe média. Seguiu-se o AI5. E marcante para o Rubens nesse período (coincidência, ou suas teorias da conspiração faziam total sentido?), foi o incêndio no MAM. O incêndio causou o arrasamento das obras de Torres Garcia. Ele, o Rubens, nas fotografias, cabeludo e convicto de uma máquina burocrática se não facistóide, no mínimo descompromissada com a Cultura de seu país, tinha certeza de que o incêndio no MAM não era descaso coisa nenhuma; era uma chamada, um pré-aviso da repressão.

E aí, também posso escrever-falar por décadas desse meu padastro tão especial, amigo e ídolo; o Rubens, mon cheri.

Mas aqui, um vídeo que fiz percorrendo sua obra de 1962 a 1979, o tempo em que diagramava fotonovelas na Sétimo Céu, o tempo do AI5, o tempo que pesquisou populações do alto Xingú, depois o tempo de bolsista em Nova York (comendo o sopão de domingo no Botero, que segundo ele, vivia bem, pois era bancado pela máfia Colombiana, rsrs), o tempo de seu amor incondicional pelo futebol e pelo flamengo (esse tempo foi sempre), o tempo da sensação dos concursos de Miss Brasil e dos primeiros sutiãs feministas, e retribuo, minúsculamente, ao carinho que ele esbanjou, dizendo da saudade tremenda que sinto dele. O artista que me criou. O Rubens.




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